
TIT segue STF e livra contribuinte de ICMS
Uma fabricante de eletroeletrônicos conseguiu, na Câmara Superior do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) de São Paulo, derrubar cobrança de ICMS sobre a transferência de mercadorias entre filial em São Paulo e a matriz em Manaus. Os juízes aplicaram a modulação de efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou o fim da exigência do imposto estadual nas operações, de um Estado para outro, entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte, a partir do ano de 2024 (ADC 49).
No caso, a fabricante foi autuada por erro na aplicação da alíquota interestadual do ICMS em transferências aos Estados do Amazonas e Minas Gerais. Adotou 4%, com base na Resolução nº 13, de 2012, do Senado Federal, para operações com mercadorias importadas. Para a fiscalização, porém, o tributo deveria ser calculado às alíquotas de 7% ou 12% – para saídas com destino aos Estados do Amazonas e Minas Gerais, respectivamente.
Na Câmara Superior do TIT, apesar de ter recolhido o imposto estadual, o contribuinte defendeu a aplicação do precedente do Supremo. Em 2021, os ministros declararam inconstitucional a cobrança do ICMS na transferência de mercadorias, de um Estado para outro, entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte e, dois anos depois, modularam os efeitos da decisão.
Pela modulação, o entendimento vale a partir do exercício financeiro de 2024, exceto para processos administrativos ou judiciais pendentes de julgamento até 29 de abril de 2021, data da publicação da ata de julgamento da decisão de mérito da ADC 49 – o que incluiria o caso da fabricante de eletroeletrônicos.
Na decisão, o relator do caso, Carlos Americo Domeneghetti Badia, destaca que “a ressalva da aplicabilidade imediata para os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito se amolda ao caso presente, já que o AIIM [Auto de Infração e Imposição de Multa] foi lavrado em 9 de dezembro de 2019 e até o momento não foi definitivamente avaliado”.
O relator, em seu voto, acolheu parcialmente o recurso do contribuinte. Levou em consideração que nem todas as operações impugnadas se deram entre estabelecimentos da fabricante de eletroeletrônicos. Haveria remessas ao Estado de Minas Gerais, para clientes. “Correta a cobrança da diferença apurada entre essas alíquotas e as aplicadas nos documentos fiscais emitidos pela autuada”, diz ele no voto, limitando, porém, os juros sobre a cobrança aos patamares da Selic.
A defesa do contribuinte pretende recorrer ao Judiciário para manter a alíquota de ICMS aplicada. De acordo com o advogado Pedro Demartini, do Souto Correa Advogados, há como comprovar, a partir de documentos da época, que os requisitos para a adoção do percentual de 4% foram cumpridos. Pela Resolução nº 13, de 2012, do Senado, a alíquota de 4% não vale para bens e mercadorias importados que não tenham similar nacional.
“Apesar da vitória quanto à aplicação da ADC 49 ao caso, o Fisco considerou erroneamente que as mercadorias não têm similar nacional e, no Judiciário, será possível comprovarmos que a alíquota aplicada condiz com os produtos”, afirma.
Para Caio Cesar Nader Quintella, sócio de Nader Quintella Advogados, a decisão da Câmara Superior do TIT “é um excelente precedente, acertado, que mostra de maneira exemplar a integração entre o controle concentrado do Poder Judiciário e os tribunais administrativos”.
“Não existe outro melhor meio e nem menos oneroso do que a utilização do processo administrativo tributário para reduzir o contencioso antes mesmo de chegar ao Poder Judiciário”, diz o advogado.
O que chama a atenção, segundo Eduardo Salusse, sócio do Salusse Marangoni Parente e Jabur Advogados, é a dificuldade do tribunal administrativo para seguir a jurisprudência pacificada no Judiciário. “Esse tema já havia sido definido por meio da Súmula 166 do Superior Tribunal de Justiça, em 1996, embora não possuísse efeitos vinculantes, até por ter sido expedida em época de vigência do Código de Processo Civil anterior”, diz o tributarista.
Salusse afirma que há vários exemplos dessa postura, como esse caso específico e também da inconstitucionalidade da cobrança de juros acima da taxa Selic. “A própria Procuradoria Geral do Estado expediu normas dispensando a contestação ou apresentação de recursos em processos judiciais sobre esses temas, haja vista terem sido pacificados no Judiciário”, diz. “Mas, mesmo assim, os tribunais administrativos insistiram em contrariar o entendimento por muitos anos, mantendo os autos de infração.”
Ele lembra que os casos envolvendo a transferência de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte estavam represados no TIT e somente agora decidiu-se aplicar o tema da ADC 49. “O controle de legalidade pelos tribunais administrativos é essencial para uma jurisdição mais célere e efetiva.”
Fonte: Valor Econômico